Zé Pinguinha #2 – A morte das coisas
Nesta edição, leituras obrigatórias sobre o luto, o novo som straight edge, a busca por diversidade no audiovisual, boas práticas em exposições e uma análise das adaptações literárias no teatro
Oie, essa é a Zé Pinguinha!
A partir de agora, você confere uma newsletter pra quem gosta de tudo um pouco, mas não tem as pira de ser especialista em nada. Como essa é a Edição #2, não vou repetir toda a intro da News passada – caso não tenha lido, é só conferir aqui: Zé Pinguinha #1 - Insônia e boa vontade | Bebê Rena, ‘Meu ano de descanso e relaxamento’ e o ataque de André 3000 no jazz experimental.
Zap ao leitor
Antes de tudo: tem sido muito difícil tocar, produzir e divulgar um projeto paralelo às carreiras que pagam as nossas contas em uma realidade como a que vivemos. A verdade é que o lançamento dessa News foi adiado por um bom tempo em razão do desastre ambiental histórico e trágico que rolou no Rio Grande do Sul nos últimos meses.
Agora, parece banal falar sobre qualquer coisa quando está em andamento a execução do projeto misógino e assassino da criação de uma Gilead brasileira – sim, o PL 1904, que pretende equiparar o aborto ao homicídio. Há manifestações pelo país em curso, que torcemos para que fiquem ainda maiores.
Mas temos de seguir. Agora, sim, na Edição #2 encontrará uma lista definitiva de livros que abordam, em suas mais diversas formas e perspectivas, a temática do luto – talvez a nossa maior certeza na vida.
Marcando suas estreias, Duxo, Carol e raki mostram suas caras na Zé Pinguinha. Duxo traz uma lista elementar sobre o que é o novo som straight edge, mais potente e diverso do que muitos pensam. Carol dá as orientações básicas para quem busca aproveitar exposições de arte ao máximo – mostrando que essa relação não é unilateral; e raki faz uma crítica sobre adaptações literárias no teatro, a partir das peças "A casa dos budas ditosos" e "Rita Lee -- Uma autobiografia musical".
Por fim, uma comparação aleatória entre Duna 2 e Marte Um, além das primeiras entrevistas da Zé Pinguinha, com gente muito boa da internet que topou compartilhar dicas para assistirmos obras mais diversas no nosso dia a dia.
Como de costume, ao final de cada edição, um garimpo de links legais que cruzamos na internet – entre podcasts de true crime a ensaios fotográficos sobre a natureza selvagem.
Boa leitura!
Edição #2
Filmes de R$ 1 bilhão ainda fazem sentido? Acho que não!
Duna 2, mais novo ápice dos épicos Hollywoodianos, dirigido por Denis Villeneuve e ultra estrelado por Timothée Chalamet e Zendaya, custou US$ 190 milhões. Sim, Duna 2 custou cerca de R$ 1 bilhão. Para efeito de comparação, os prejuízos estimados com a catástrofe ambiental no Rio Grande do Sul chegam a R$ 10 bilhões – ou, se preferir, a dez Dunas 2.
Marte Um, filme brasileiro dirigido pelo mineiro Gabriel Martins e escolhido pela Academia Brasileira de Cinema como o representante do país no Oscar de 2023, teve um custo aproximado de produção no valor de R$ 1,2 milhão. E, vale dizer, Marte Um, com elenco e equipe formados quase que inteiramente por pessoas pretas, só saiu do papel porque fez parte de um edital federal voltado para obras de baixo orçamento e contou com a parceria do Canal Brasil em sua finalização.
Marte Um é muito melhor filme do que Duna 2. Não é só um pouco melhor, é absurdamente melhor e não há subjetividade e contexto que me façam acreditar no contrário. Minha análise será breve, porque a reflexão não é exatamente a comparação técnica dos filmes. Marte Um é talvez a melhor leitura audiovisual ficcional sobre a devastadora realidade brasileira dos últimos anos; com uma sensibilidade capaz de captar a tragédia que o nosso Brasilzão viveu na sua história recente, a partir de uma perspectiva intimista e familiar, trazendo num microcosmo o retrato fiel e maravilhoso de um todo que ainda não desistiu de sonhar. Vou morrer sem entender porque diabos Marte Um não viralizou como Bacurau (que é um filmão). Já Duna 2 é um filme chato! Sim, um filme de R$ 1 bilhão que consegue ser chato, mal escrito, chocantemente mal dirigido (é bizarro como não há uma boa cena de ação neste longuíssimo filme de ação) e termina sem dizer nada – só com a impressão de que o seu parque na Disney será muito fiel ao filme. Que dinheiro mal gasto!
Mas este não é um texto sobre disparidade econômica, apesar de também ser. É, na real, uma tentativa de convite à reflexão: será que ainda vale a pena alocar nosso tempo e suado dinheirinho em coisa ruim? Acho que não.
Dando início às primeiras entrevistas na nossa querida Zé Pinguinha, fui atrás de alguns influenciadores pessoais que sou fã e me ajudam a consumir audiovisual de forma mais diversa para ajudar com toda essa questão na minha mente. Para Ana Paula Barbosa, criadora do Narrativa Feminina, página de ‘cinema e cultura pop por uma perspectiva feminina e LGBTQIAP+’; Raissa Ferreira, crítica da Filmes e Filmes, e Victor Russo, fundador do canal 16mmilímetros, fiz a mesma pergunta: como trazer mais diversidade aos filmes e séries que assistimos no dia a dia?
Abaixo, compartilho suas respostas, na íntegra:
Ana Paula Barbosa, criadora do Narrativa Feminina:
Olha, eu acho que é realmente dar atenção para críticos e criadores que falam diversidade atrás das câmeras e fugir de seguir apenas homens brancos cisgênero heterossexual que falam de filmes. Se a pessoa tem conta no Letterboxd é bem fácil de achar listas diversas por lá e saber o nome de quem está na direção. Aqui no Brasil a gente tem o FilmeB, um site excelente que mostra as informações dos filmes que vão estrear nos cinemas, além de todo o quadro de estreias do ano. Mas, em geral, o exercício e o esforço de trazer mais diversidade de filmes e séries pro nosso dia a dia vai ser todo nosso. Nada vai chegar de mão beijada pra gente, então precisamos tornar isso uma prática. Eu tento tornar as coisas mais fáceis para o meu público, sempre avisando os filmes e séries feitos por mulheres estreando, mas eu sou uma só, então sei que não consigo suprir todas as minorias e lacunas. Por isso, é fundamental a gente incentivar e apoiar muitas criadoras mulheres e muitos criadores não-brancos. Falo sempre para as minhas seguidoras: ampliem o leque, sigam mais mulheres.
Raissa Ferreira, crítica da Filmes e Filmes:
Como os próprios streamings mais conhecidos limitam muito o acesso a uma diversidade maior de filmes de diferentes décadas, países e afins, e pensando nessa curadoria também nos cinemas, em que cidades menores mal recebem qualquer coisa que não sejam os blockbusters de shopping de sempre, hoje no Brasil, acredito que a resposta esteja na procura e curiosidade do próprio espectador. Como tudo no capitalismo, se torna uma alternativa individual, que depende de cada um ir atrás, seja consumindo o conteúdo de produtores, críticos e outros relacionados ao audiovisual que comuniquem essa diversidade e auxiliem com dicas e listas, ou por conta própria, pesquisando, lendo, encontrando listagens (o Letterboxd é um ótimo aplicativo para isso) e textos que possam abrir os horizontes. A melhor alternativa é buscar os filmes em outros meios, como o youtube que tem diversos canais dedicados a filmes antigos, streamings menores (e mais acessíveis financeiramente) como a Filmicca, Reserva Imovision, Belas Artes à La Carte, entre outros, ou mais caros e com maior catálogo, como a Mubi e, não dá pra negar e fugir do óbvio, a pirataria é uma forma importante (e gratuita) de democratizar o acesso a obras mais diversas e preservar a cultura, visto que os streamings mais famosos e maiores tendem a não apenas ignorar muitas obras do passado como removem deles muitas coisas, até conteúdos próprios, limitando cada vez mais o acesso a filmes e séries. Se alguém depende puramente do que está na Netflix ou nos principais cinemas de shopping, vai perder muita coisa, mas para aqueles que moram em cidades grandes, com cinemas de rua e festivais, também vale ser curioso e começar a buscar coisas novas.
Victor Russo, fundador do canal 16mmilímetros:
Como uma arte que já nasce na era do capitalismo, o cinema quase sempre foi encarado e vendido como produto, e não como arte. Assim, desde os anos 1930, e, principalmente após a Segunda Guerra, com algumas pequenas exceções históricas, Hollywood sempre teve esse domínio do consumo em termos globais e, no Brasil, principalmente a partir da década de 1980 e a destruição da Embrafilme pelo governo Collor. Então, o capitalismo trata de destruir qualquer competição e manter esse mercado dominante como essa sensação de única opção de consumo (o que inclui até mesmo os festivais de cinema, que são dominados por obras americanas e europeias de países da chamada Europa Ocidental). Nesse sentido, o capitalismo vai sempre querer vender o novo, então, até filmes dessas regiões vão sendo apagados com o passar do tempo, definitivamente os maiores streamings nem de perto preservam a história. Como resistência, sobra um nicho, a crítica e a cinefilia, cada vez mais restrita a uma bolha, já que até mesmo esses espaços vão perdendo lugar nas redes sociais para aquele conteúdo de mais fácil assimilação e mais benéfico para esses grandes estúdios, no caso, os influenciadores digitais que se vendem como críticos, mas sem propor qualquer reflexão. Digo tudo isso para perceber que no final, dentro do capitalismo, resta apenas o individual, o interesse de cada um, já que as obras fora desse eixo dominante sempre serão jogadas para uma margem, nunca terão visibilidade simples. Os cinemas de quase todas as cidades do nosso parque exibidor não darão esse espaço, o mesmo vale para os grandes streamings. Resta o Globoplay/Telecine e a Mubi com alguma popularidade, além de Belas Artes, Filmicca, Oldflix e alguns menos conhecidos, além de muitas obras de graça no YouTube, como uma resistência "legal" a esse processo, que só terá um acervo realmente mais amplo com a pirataria, único meio de mitigar o problema, ainda que longe de resolvê-lo. Outra dificuldade surge em o que assistir, e, nesse sentido, streamings com curadoria como a Mubi e o Belas Artes podem ajudar, mas a melhor ferramenta é seguir críticos e cinéfilos no Letterboxd, aplicativo perfeito para mergulhar em um mundo de filmes pouco comentados fora da bolha.
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Depois dessas reflexões para lá de incríveis, e apesar de ter odiado o tempo que perdi assistindo aos dois Dunas, penso que não tenho a intenção de dizer aqui que devemos cortar esse tipo de filme e série da nossa vida. Eu simplesmente acho impossível viver consumindo só um tipo de “arte” e acho que isso nem existe. Na vida como ela é (corrida, estressante, hiperestimulada, doente, vazia e deprimente), às vezes uma maratona de Casamento às Cegas é realmente tudo que o trabalhador precisa.
No entanto, quando sobra tempo e uma grana (o que é tão raro!), será que temos acesso a todas as opções ou só somos ridiculamente bombardeados pelos bilionários cofres do status quo? Será que queremos assistir a Vingadores 12? Será que o filme ‘Lobos’, com George Clooney e Brad Pitt estrelando senhores armados, é a melhor saída? Será mesmo? Acho que não.
Serviço:
Marte Um está disponível nas plataformas:
Globoplay
Amazon Prime Video
YouTube por R$ 3,90
Google Play Filmes por R$ 3,90
Never forget: Duna 2 custou um BILHÃO de reais.
Ainda sobre o PL 1904, assista Nunca, Raramente, Às Vezes, Sempre, da diretora Eliza Hittman. No mínimo, dê uma chance ao trailer.
Por Rennan
Luteratura: uma lista de livros sobre luto
Muitos falam que a grande e a única certeza que a gente tem na vida é ela: a morte. Saber disso, no entanto, não torna mais fácil quando temos que encará-la de frente, quando acontece com a gente. Ninguém conta que, junto com a morte, vem também o luto.
A verdade é que existem muitos lutos, mas, para efeito desta edição, vou me ater a um tipo de luto: o luto pelo fim da vida. Para outros tipos de luto, vários formatos em que ele pode vir, deixo a recomendação do Podcast Finitude, do jornalista Renan Sukevicius.
O luto é uma experiência intensa e ilusória porque faz a gente acreditar que a nossa dor é única, que ninguém mais passou por aquilo que a gente tá passando naquele momento. Como se tantas outras pessoas não precisassem conviver com a tristeza de perder uma vida de alguém que se ama.
Na última edição, comentei que traria uma lista de livros que tratam de luto. Há uma observação: a lista que curei foi com base em leituras que fiz e, de novo, sobre o luto pelo fim da vida. Nessa lista, fiz um recorte sobre o luto de perder alguém com mais idade (uma avó, um pai, uma mãe), um amor ou a própria vida. Não há nenhum motivo específico a não ser esse: porque eu quis. Acredito que, com um olhar cuidadoso, muita coisa pode ser considerada luto.
Os livros que indico aqui não têm muito em comum além disso. São histórias, formatos e tamanhos diferentes (mas nem tanto). De toda forma, espero que goste.
#1 - As pequenas chances, de Natália Timmerman
Este é um romance de autoficção o que por si só já acho corajoso, mas a coragem mesmo vem do relato cru e poético que avança pelo livro todo. A protagonista (que divide nome com a autora) encontra o médico de cuidados paliativos do pai no aeroporto. Volta com esse encontro as lembranças que foram enfiadas no fundo da mente, escondidas, soterradas. Por aqui ressoou e doeu muito.
Chorômetro: 😭😭😭😭😭 - compre o livro físico para não estragar o kindle
#2 - A morte é um dia que vale a pena viver, de Ana Claudia Quintana Arantes
O livro da Dra. Ana Claudia foi inspirado em um TED Talk dela. É um convite para a gente olhar pra vida com mais apreço, ter uma visão de retrospectiva com a nossa própria vida. A autora compartilha muito da sua jornada como médica paliativista, sobre a vivência de morte dos pacientes, das relações e papéis das pessoas nesse processo. Há tantos ensinamentos, tantas coisas pesadas ditas de forma delicada em uma escrita fluída e muito agradável.
Chorômetro: 😭😭😭😭 - de ler com lencinho do lado
#3 - Menina Nina, do Ziraldo
É sim um livro para abordar o assunto da morte com crianças, mas vale a leitura em qualquer idade. Mais do que tratar de luto e de morte e vida, passa por toda a jornada que a gente tem de tentar reconstruir o passado que a gente não conhece da pessoa que se foi. Contado de maneira poética, com lindas ilustrações, o livro é inesquecível: eu mesma ganhei meu exemplar de uma amiga querida da minha mãe quando tinha uns 6 anos e nunca mais superei.
Chorômetro: 😭😭😭😭😭 - Como pode um livro infantil acabar com a vida de alguém, não é mesmo?
#4 - Meu ano de descanso e relaxamento, de Ottessa Moshfegh
Fiz uma extensa observação sobre esse livro na primeira edição da Zé Pinguinha, que você pode encontrar aqui. Não vou, portanto, me estender na sinopse e minhas impressões. Para mim, este é um livro sobre luto que faz de conta que não é. Há uma combinação interessante, uma negação da personagem principal de que todos os seus processos não têm origem nessa exata questão. Há os elefantes brancos dos relacionamentos cheios de camadas com os que partiram, o tentar manter alguma normalidade dentro da loucura. É mais uma camada obscura para esse livro que segue ressoando para mim.
Chorômetro: 😭 - Tirando algumas passagens sentidas, não é chorável.
Ah, um detalhe: descobri esses dias que o Yorgus Lanthimus vai adaptar o livro para o cinema. Espero que o Rennan dê os dois centavos dele sobre isso no futuro.
#5 - Menção honrosa. Prêmio Vita Não Li Mas Logo Lerei: Aos Prantos no Mercado, de Michelle Zauner
Outra Zé Pinguinha, a Vita, minha maior influência literária, me recomendou esse livro aqui. A Raki também. Como tudo que as duas recomendam se torna lei, vou ler. Fiquei em êxtase ao descobrir que, além de fazer um belo rock-mulher-triste-com-guitarrinha (um dos melhores gêneros musicais, diga-se de passagem) com a banda Japanese Breakfast, esta senhora escreveu este livro que é uma verdadeira imersão no luto da morte da sua mãe. Muitas questões e temas como imigração, mommy issues, transtorno alimentar e etc. Ansiosa para ler. Fica aí a recomendação para você também.
Chorômetro: 😭😭😭😭😭 - Chorei com a sinopse. Socorro.
Agradeço sua leitura até aqui. Caso leia algum desses e queira discutir, é só me procurar. Não sei muito bem como funcionam clubes do livro (frequentei mais clubes de fanfic), mas podemos discutir. No mais, nos vemos na próxima edição.
Por Beta
STRAIGHTEDGE EM 2024
Desde os anos 80 até agora, o rolê straightedge evoluiu na mesma medida que se manteve exatamente igual. A ideologia imutável – e cada dia mais relevante – de rejeitar as formas de anestesia que o status quo nos força goela abaixo sempre veio acompanhada de uma trilha sonora excelente, que se transforma e se adapta ao cenário de “música brava” de seu tempo. Se antes esse era um cenário dominado por carecas de bermuda, agora ele é habitado por jovens não-binários, metaleiros suaves, adultos órfãos do Title Fight e tantas outras pessoas. Essa evolução que acompanha o mundo também se reflete na música, obviamente.
Atualmente, o som straightedge é bem diverso. Enquanto no início dessa cena havia uma paleta sonora razoavelmente uniforme – como uma evolução daquele hardcore com sabor de punk –, hoje as bandas são muito mais heterogêneas.
Pensando nisso, aqui vão algumas bandas (e uma música de cada) compondo uma pequena playlist que espero servir de vitrine para o que está sendo feito nessa cena tão massa.
No Cure – Parasite (TWO SHOTS)
Do lado mais extremo desse cenário, o No Cure, do Alabama, é uma banda recente que tem feito um barulho considerável e parece estar constantemente tocando ao vivo. Com nomes de música completamente explícitos como “No Cure Straight Edge Die Slow Fuck You”, a mensagem é clara e o som abrasivo. Música pra quem gosta de metal verdadeiramente extremo na mesma medida que gosta de Youth of Today.
One Step Close – I Feel So
Virando drasticamente a rota, One Step Closer, da Pennsylvania, faz um som melódico e que flerta MUITO com toda onda do post-hardcore-camisa-de-flanela e emo em geral. Paleta sonora jovem e cheia de energia e esperança por dias melhores ao mesmo tempo que abraça a melancolia de estar vivo e atento aos problemas à sua volta.
Inclination – Epidemic
Eu contemplei por um tempo colocar o xWeaponx nessa lista, mas resolvi colocar o outro projeto straightedge com membros do Knocked Loose. Inclination é uma banda escancaradamente DE HARDCORE, dado que todas as características estão aqui e todas tomam a frente: groove simplão e constante, vocal meio desesperado, chuva de belos riffs de guitarra e uma agressividade inata. Se você gosta de um som aos moldes clássicos mas executado com as sensibilidades dos dias atuais, arrisco que vai gostar dessa banda.
Balmora – Under the Weight of a Blackened Sky
Possivelmente a banda mais jovem dessa lista, o Balmora, de Connecticut, é uma brisa fresca para o cenário tão saturado de Metalcore. O som deles evoca o melhor do Death Metal melódico americano dos anos 2000 com tudo de bom e ruim que isso traz. Não é o grupo de músicos mais afiado do mundo ainda, mas, com apenas 8 músicas lançadas (sendo uma delas uma introdução instrumental) existe um potencial gigante para o crescimento. Pontos extras por terem tirado o nome de uma cidade do jogo Morrowind.
Clava – Oeste
Diretamente do Rio de Janeiro, Clava é uma banda que lançou seu primeiro material em 2021. Música extremamente urgente e implacável com doses cavalares de riffs de Death Metal. Afiada, barulhenta e carregando uma verdade e uma denúncia que só quem vem do dito terceiro mundo consegue se relacionar. Com todo respeito à maioria das bandas americanas dessa lista, mas por aqui os desafios são exponencialmente maiores.
Rain of Salvation – The Sound of Triumph
Com membros de Nova York e Connecticut, Rain of Salvation é uma banda que eu descobri completamente por acaso em um vídeo do Hate5six há um tempo atrás. Acho que é a banda que eu tenho menos o que dizer: straightedge padrão. Muito puto e com muita crença. Como deve ser.
Year of the Knife – Heaven Denied
Essa banda passou por muita provação em tempos recentes. O último álbum foi lançado quando os membros da banda se recuperavam de um traumático acidente com a van deles que deixou os 5 hospitalizados e a vocalista Madison Watkins entubada em estado grave por vários dias. Uma pena não poderem ter aproveitado o momento para colher os louros da glória ao vivo, porque o som deles evoluiu muito desde que surgiram nove anos atrás e esse disco é, sem dúvida, a melhor coisa que já fizeram. Pesadíssimo e com raiva de sobra.
Raw Brigade – Terrorist
Da Colômbia, Raw Brigade carrega no nome a característica mais marcante do que fazem: crueza. Como comentei sobre o Clava, dá pra ouvir o quão honesto é o grito deles. As guitarras sujíssimas e a bagaceira geral do som contribuem imensamente para a estética de desolação, revolta e perseverança.
Anklebiter – I Am...
Banda extremamente jovem e disparada a que tem o melhor design gráfico de toda essa lista. O vocal é bem podre, esganiçado e pueril – falo como um elogio – e o resto da banda parece estar sempre a prestes a errar tudo – de novo, falo como elogio. Banda que soa divertidíssima e, como já falei, um olho AFIADÍSSIMO para design das capas.
Por Duxo
Não adianta incluir o aluno se não há a inclusão do professor
E era isso mesmo que eu queria falar: não adianta incluir o aluno se não há a inclusão do professor.
Etiqueta para Exposições de Arte
Não coloque a mão na obra caso não tenha sido explicitado que é permitido.
Não fale alto ou comente efusivamente. Pode parecer chato para alguns, mas o silêncio é uma ferramenta muito poderosa de contemplação.
Não coma ou beba dentro do espaço expositivo a não ser que tenha sido explicitado que é permitido.
Tome seu tempo para absorver aquilo que está vendo. Não há nenhum problema em se demorar em uma exposição. Entrar e sair da sala olhando tudo no 1.5x é uma oportunidade perdida.
Em vernissages ou finissages, converse sim com o artista. Mas lembre que este é um momento especial e nem sempre a pessoa vai poder te dar toda atenção do mundo. Arte também é trabalho e ele está ali cumprindo com as obrigações exigidas pela profissão.
Viu uma obra e não entendeu? Dê um Google e procure sobre a pesquisa do artista. Muitas vezes o que vemos é um trabalho do meio do processo, de uma série específica, dentro de um universo muito maior. Sites e páginas de rede social nos ajudam bastante nessa hora. Se a exposição conta com recursos de acessibilidade, como audiodescrição, utilize-os.
Leia a ficha técnica. Os materiais com os quais as obras são feitas são grandes dicas para entender um pouco mais sobre o objetivo do artista com aquele trabalho.
Não comente valores se as obras expostas estiverem à venda. É deselegante.
Você poderia ter feito isso também? Então tá, vai nos avisando.
Por Carol
a casa absurda dos budas ditosos e uma rita lee family-friendly: duas adaptações literárias no teatro em um final de semana
faz muito tempo que não escrevo uma análise séria sobre qualquer coisa - mas eu abraço a natureza do zé pinguinha, que me acolhe de volta, e decido escrever uma análise (que é uma crítica, na verdade).
isso pontuado, no começo de junho, depois de uma badtrip bem da esquisita e não intencional, tive o prazer de assistir duas peças muito concorridas em são paulo num final de semana: "a casa dos budas ditosos", estrelado pela espetacular fernanda torres, adaptado por domingos de oliveira e inspirado no romance homônimo de joão ubaldo ribeiro; e "rita lee - uma autobiografia musical", estrelado pela minha crush-mor mel lisboa, e dirigido por marcio macena e débora dubois, adaptando as autobiografias de rita.
caí num fato interessante: as duas peças são adaptações de livros para atuações teatrais. uma coincidência que me fez refletir bastante a respeito dos resultados de ambas as peças, com fonte: eu.
"a casa dos budas ditosos", devo admitir, quis ver unicamente por fernanda torres. desde que assisti "fim" (outra adaptação incrível), adquiri uma obsessão extra por fernanda.
não sabia quase nada a respeito da peça, a não ser que é um monólogo e que vem de um livro cujo autor eu nunca ouvi falar.
a história é a seguinte: joão ubaldo encontrou fitas gravadas de uma baiana de 68 anos identificada por "CLB", contando suas aventuras sexuais e amorosas. à época, ubaldo estava escrevendo uma série chamada "plenos pecados", em que cada título contempla um pecado capital. este contempla o pecado da luxúria.
a produção é simples: um microfone, uma mesa, uma cadeira e uma fernanda torres completamente inerte em sua personagem, que é interpretada pela atriz desde 2003.
o tom do monólogo é de uma comédia absurda e desconfortável. o público dos budas ditosos não deve esperar nenhuma fala morna; e passa bem longe de qualquer stand-up (odeio stand-ups). a adaptação de domingos e a atuação de fernanda transformam o texto mais absurdo na libertação de uma risada culposa lá do fundo do inconsciente.
espere por relatos sobre orgias, voyeurismo, sadismo e incesto. a baiana algumas vezes diz: "quem é que nunca fez [insira qualquer prática sexual absurda]? digo, não que seja obrigatório fazer; mas estou dizendo que tudo bem fazer". há alguns trabalhos acadêmicos tratando do deboche da personagem, a intertextualidade bíblica etc e tal. e acho que é mais ou menos por aí.
é claro que eu poderia falar aqui sobre a libertação sexual das mulheres, sobretudo se a gente considerar o período em que o livro foi lançado (final dos 90). mas não quero reduzir o deboche dessa personagem a isso. o desconforto é muito maior do que esse discurso batido de feminismo que põe homem pra nanar. aqui estamos falando de uma piscina com tobogã pra freud.
o objetivo é chocar, escrachar, fazer o público olhar pro espelho e questionar seus valores a partir dos relatos mais bizarros, que são contados de uma forma cômica e coloquial. aliás, dá pra pegar o gancho daquele livro (justamente de) freud - o chiste e sua relação com o inconsciente. perto do final, a personagem diz algo como: "seria meu sonho se vocês apertassem a bunda da pessoa que está aí do seu lado".
gostei muito do desconforto que o trio domingos, ubaldo e fernanda me deixaram; acho que vale a pena a leitura do livro, que parece ser narrado em primeira pessoa também (amo!). na peça dá para mergulhar na narrativa, você se sente numa mesa de bar com a baiana. mas tem que segurar o rajadão.
bom pra quem já está acostumado a esconder sentimentos – se você é uma dessas pessoas, pode levar até sua mãe pra te acompanhar na peça. meu caso.
agora, pra falar a verdade, fica até chato comentar a respeito de "rita lee - uma autobiografia musical". não porque a peça não seja boa... mas porque eu saí dos budas ditosos esperando ver, no palco, a rita dos livros. sim, porque a rita dos livros é diferente da rita da TV, ou da rita do palco. a escrita de rita em suas autobiografias é de uma consciência inacreditável, um fluxo de pensamento que deixa a escriba do umbral do xwitter no chinelo.
eu esperava isso da peça: o texto de rita. a profundidade e a ironia ritaleesticas. queria que falassem das inseguranças dela, do profundo momento de luto e da sua relação com as drogas (que a levou para diversas internações em clínicas e que já causou até um acidente em que ela poderia ter perdido a vida).
e encontrei uma versão light, como uma versão do globo repórter do que foi a vida de rita lee. a atuação de mel lisboa é impecável (a bicha é talentosa! - vale caçar outros trabalhos dela, como paciente 63 no spotify), a produção é incrível e a qualidade sonora é boa pra audiófilos. os atores também são bons e cantam bem. e eu odeio musicais, mas aqui as músicas fazem sentido na narrativa.
no entanto, faltou o que sobrou em budas ditosos: o desconforto e a ironia. faltou emoção. ficou mais parecendo um conto de fadas, colocaram rita numa posição de protagonista de filme da disney. há críticas sociais muito batidas. bom pra classe média se sentir resistência. a cena em que rita é presa não passa nem perto de sua descrição na autobiografia e também não me lembro de comentarem sobre suas internações em clínicas de reabilitação.
bom pra ir com família, sem se preocupar em esconder sentimentos. uma adaptação meio domingo em família mesmo. é legal, mas esperava mais. prefiro reler os livros e me divertir com a mente pra lá de tuiteira que rita tinha.
de todo modo, vale contrastar as duas adaptações e perceber que os objetivos discursivos são totalmente diferentes; e, no caso da autobiografia musical, há uma distância gritante da obra-fonte.
mas ir pro teatro é muito bom. é uma experiência 100% imersiva. não dá pra achar na internet. não dá pra rebobinar a fita. não tem registro de cena. a não ser na nossa própria cabeça. e justamente por isso, vale prestigiar os dois espetáculos!
por raki
Só link do bão!
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Notícias, compras e neonazismo: os sites do Brasil que ensinam português para IAs, por Estadão
FAQ de perguntas não feitas:
O que é Zé Pinguinha?
Zé Pinguinha é um termo GENIAL criado de forma completamente aleatória e não planejada em 2023 por uma das fundadoras deste projeto que se aplica a todo e qualquer caga-regra digital, seja sobre cinema, música, tv, arte, literatura, gastronomia, etc, etc, etc. Desde então, o bordão nunca mais saiu das nossas bocas. Agora, ganhará o mundo. Há!
Quem faz a Zé Pinguinha?
Uma seleção absurda de gente incrível e bom coração. Não somos conhecidos (ainda), mas gostamos e temos nos divertido ao discutir diversos assuntos. Com a news, ampliamos o papo até você.
Um tiquinho mais abaixo:
Carol - Artista e professora de Arte.
Duxo - Músico e diretor de Arte
Matheus – Jornalista e eterno curioso.
Raki - Mestranda em Letras e UX Writer.
Rennan – Jornalista e idealizador do projeto.
Beta – Comunicadora, escritora amadora, yogini e criadora do termo Zé Pinguinha.
Vita - Bióloga e analista de dados.
O que você encontra na Zé Pinguinha?
A newsletter nasceu de uma vontade quase angustiante de produzir de forma leve, não remunerada e despropositada. Com tanta gente que trabalha com (ou é apaixonada por) conteúdo neste grupo, ficou meio claro como é difícil comunicar fora do ambiente de trabalho. Aqui, buscamos uma pequena saída para essa questão tão difícil de tratar na terapia. A cada edição, alguns de nós trarão visões, reflexões, dicas e coisinhas sobre os mais diversos temas deste mundão. De audiovisual à gastronomia, passando por artes, internet, música e divagações. Aceitamos sugestões.
E quando a Zé Pinguinha será publicada?
Quando der! Somo tudo peão!
Quer ajudar os Zé Pinguinhas? Indica a News para a turma!